TARZAN

(EUA, 1912 ; 1929 na BD)
"TARZAN DOS MACACOS" - "O REI DA SELVA"
(CONTINENTE AFRICANO - SÉCULO XX)



Nascido em 1912, fruto da imaginação e da inspiração do escritor norte-americano Edgar Rice Burroughs (1875-1950), "Tarzan" é talvez o maior mito do século XX e a mais duradoura referência da moderna cultura popular, surgida do cruzamento do sonho com as técnicas de marketing. Com efeito, não será exagero considerar "Tarzan" o mais célebre herói de ficção do século passado, ultrapassando em popularidade outros heróis igualmente famosos, tais como "Tintin", "Astérix", "Rato Mickey", "Super Homem", "Flash Gordon", "Mandrake", "Fantasma", "Príncipe Valente", entre muitos outros.

"Tarzan" conseguiu, de facto, o feito extraordinário de estender o seu domínio a áreas tão diversificadas como a literatura, o cinema, a televisão, a rádio, a banda desenhada, os desenhos animados ou os jogos de vídeo. Ironicamente e de forma paradoxal, constata-se que se, por um lado, é ao cinema que a figura do "Rei da Selva" deve a sua fama universal e imortalidade, por outro lado, foi essa mesma "Sétima Arte" que mais distorceu o espírito inicial da criação do genial Edgar Rice Burroughs.
Foi na edição de Outubro de 1912 da revista mensal "The All-Story" que começou a ser publicada uma espécie de fábula moderna intitulada "Tarzan of the Apes" ("Tarzan dos Macacos"), assinada pelo escritor Norman Bean, pseudónimo usado, inicialmente, por Edgar Rice Burroughs. Perante o êxito alcançado pela narrativa - que contava as atribulações e peripécias vividas pelo filho de um lorde inglês (Greystoke) que é educado por gorilas e chimpanzés na floresta equatorial africana - tanto o público leitor como o editor pediram a Burroughs que acrescentasse mais episódios e prolongasse as histórias por mais uns tempos.

A história de "Tarzan" inicia-se quando, na sequência de um naufrágio, o casal aristocrático inglês, Lord Greystoke, esposa e filho conseguem chegar a uma praia, na costa africana. Os seus pais morrem pouco tempo depois e deixam orfão o pequeno branco indefeso, que é recolhido e protegido por "Kala", uma grande fêmea gorila que o livra de uma morte certa. Criado no seio dos símios superiores na mais completa liberdade, o jovem "Tarzan" vai, progressivamente, adquirindo uma notável robustez e agilidade físicas e aprende, inclusivamente, a linguagem dos animais.

Mais tarde, "Tarzan" conhece uma rapariga chamada "Jane", que se torna a sua inseparável companheira de muitas aventuras pelos quatro cantos do planeta, penetrando em mundos fantásticos, como, por exemplo, quando descem ao centro da Terra ou visitam civilizações míticas perdidas na alvorada dos tempos.

Entretanto, "Tarzan" adquire um profundo sentido de humanidade e de justiça, pondo-se ao serviço dos indefesos e de causas nobres, combatendo tribos selvagens e homens brancos gananciosos e desonestos. Quando um dia, "Tarzan" descobre as suas próprias origens, regressa a Inglaterra e a Londres para uma curta estadia, mas rapidamente chega à conclusão de que o mundo dito civilizado e os costumes burgueses não são feitos para ele e decide, assim, regressar definitivamente à selva africana.
Edgar Rice Burroughs destacou-se, sobretudo, pela sua inteligência intuitiva, possuindo uma grande inspiração criativa e imaginação, aliando a estas qualidades, um extraordinário dom de contar histórias e de criar climas de suspense. A África que utiliza para pano de fundo das suas narrativas e aventuras nada tem que ver com o continente real, pois trata-se de uma África "fantasma", "imaginária" e "irreal", habitada por povos estranhos, descendentes de antigos fenícios, romanos ou cruzados.

A aventura "The Return of Tarzan" ("O Regresso de Tarzan"), dada à estampa em 1913 e assinada já com o verdadeiro nome do autor, seguir-se-iam, em revista e em livro, até 1944 (seis anos antes da morte de Burroughs) mais algumas dezenas de títulos, num total de 43, incluindo romances e contos traduzidos para o mundo inteiro. A partir de 1918, as aventuras de "Tarzan" são adaptadas ao cinema, tendo sido produzidos, desde então e até hoje, cerca de 50 filmes deste herói, incluindo desenhos animados produzidos pela "Disney".

A adesão popular às histórias de Edgar Rice Burroughs foi de tal modo imediata que conduziu à exploração do herói em muitas e variadas direcções, entre as quais (a que nos interessa para o caso), a banda desenhada. Ao contrário do que se passou com o cinema, onde a transposição do espírito de Burroughs nunca foi totalmente conseguida, a banda desenhada só muito raramente se afastou do universo concebido pelo inventor de "Tarzan".

No início do ano de 1929, "Tarzan" passa também a ser adaptado para banda desenhada, aparecendo as suas aventuras oficialmente nos jornais diários americanos, distribuídos pelo "Metropolitan Newspaper Syndicate" (um ano mais tarde integrado no "United Features Syndicate"), sob a forma de tiras diárias assinadas por Harold Foster, um prestigiado publicitário reconvertido, entretanto, ao realismo figurativo da banda desenhada.

Harold Foster, o primeiro autor das tiras diárias, que aparecem pela primeira vez a 7 de Janeiro de 1929, desenha, assim, as 60 primeiras tiras, seguindo-se a este na série (que termina em 1973) os seguintes artistas: Rex Maxon (1929-36), William Juhré (1936-38), novamente Rex Maxon (1938-47), Burne Hogarth (1947), Dan Barry (1948-49), John Letti (1949), Paul Reinman (1949), Nicholas Viskardy (1950), Bob Lubbers (1950-54), John Celardo (1954-67) e Russ Manning (1967-73).
Relativamente às "sunday pages" (páginas dominicais), surgidas pela primeira vez a 15 de Março de 1931, com a assinatura de Rex Maxon, obrigatórias, ainda hoje em dia, nos jornais americanos de domingo, estas foram desenhadas sucessivamente por Rex Maxon (1931), Harold Foster (1931-1937), Burne Hogarth (1937-1945), Reuben Moreira (1945-47), Burne Hogarth (1947-50), Bob Lubbers (1950-54), John Celardo (1954-68), Russ Manning (1968-79), Gil Kane (1979-81), Mike Grell (1981-83) e Gray Morrow (de 1983 até ao presente).

Tal como fará, a partir de Fevereiro de 1937, na ilustração das pranchas da série de banda desenhada "Prince Valiant", também nas pranchas de "Tarzan", Harold Foster faz a ilustração acompanhada com textos em rodapé que comentam e dirigem a narrativa, rejeitando os balões como forma de integração dos diálogos. A partir de 27 de Setembro de 1931, Foster assume a produção da série nos dois formatos, passando a encarregar-se também da página dominical a cores. A série passa, então, a ter um sentido criativo único, com o predomínio da dimensão pictórica sobre a componente narrativa.

Não obstante a marca de qualidade e de talento deixada, ao longo dos anos, pelos vários artistas que se ocuparam de "Tarzan", nomeadamente Harold Foster, deve-se destacar, por ser de inteira justiça, acima de todos, Burne Hogarth, por muitos considerado o mais famoso e o melhor ilustrador/desenhador de "Tarzan", tendo, inclusivamente, ficado conhecido, com todo o mérito, por "Miguel Ângelo da Banda Desenhada". Hogarth tornou-se ainda célebre pelas suas numerosas obras sobre a anatomia dinâmica do corpo humano, técnica e arte que ele estudou profundamente e que aplicou também no desenho de "Tarzan".

Burne Hogarth sucede precisamente a Harold Foster (que passa a dedicar-se, em exclusivo, a partir de Fevereiro de 1937, à sua famosa criação, o herói medieval "Prince Valiant") na ilustração das páginas dominicais de "Tarzan". Assim, a partir de 9 de Maio de 1937 e durante 13 anos (apenas interrompidos durante um período de pouco mais de 1 ano), Hogarth trabalha de uma forma entusiástica e apaixonada, conferindo a "Tarzan" um esplendor "barroco" nunca mais atingido depois dele, expondo o herói em poses anatómicas de grande plasticidade e dinamismo.

Russ Manning foi outro importante artista de banda desenhada que se ocupou da série "Tarzan" e foi, inclusivamente, de todos os autores, aquele que se manteve mais fiel ao espírito da obra de Edgar Rice Burroughs, tendo começado a desenhar "Tarzan" a partir do fim da década de 60, quer nas pranchas diárias, quer nas páginas dominicais.

Apesar de, desde 1929 até aos nossos dias, terem passado diversos autores e artistas pela série "Tarzan", nunca a figura do "Rei da Selva" foi tão exaltada e glorificada como pelo génio de três grandes mestres: Harold Foster, Burne Hogarth e Russ Manning. Na verdade, fica-se a dever, sobretudo, a estes três artistas norte-americanos uma das mais portentosas criações da banda desenhada mundial, que, além de dar outra dimensão ao mito criado por Edgar Rice Burroughs, renovou por completo a técnica, a estética e a temática das "histórias aos quadradinhos".


Contribuição de Alexandre Ribeiro